Projeções
como tomamos decisões de importante impacto financeiro levando nosso passado na mala
Hoje vou falar sobre a escolha mais difícil da vida dos pais: a escolha da escola de um filho.
Pode parecer exagero, mas não é. Essa decisão tem taaaanta bagagem, tanta projeção, sonhos e crenças envolvidos que pode sim estar no top 1 do ranking de decisões difíceis.
Além de tudo isso, trata-se de uma decisão que vai afetar por baixo uns 14 anos da vida do seu filho (e da família).
Se no início a gente usa umas regrinhas simples pra decidir a creche da criança:
a mais barata
a mais perto do trabalho
a mais perto de casa
a mais tradicional
a mais construtivista
quando eles fazem 6 anos você sente que vai participar de uma espécie de vestibular infantil!
Eu bradei aos quatro ventos, desde que meu primeiro filho estava na minha barriga, que ele ia estudar na mesma escola que eu. Que "custe o que custar (financeiramente mesmo), eu iria pagar essa escola!!"
A lavagem cerebral era dupla
Primeira: convencer meu marido, pois, em geral, é comum que ambos os pais queiram colocar nas escolas que estudaram, quando tiveram boas experiências (e isso é uma baita de uma heurística que facilita a sua decisão ou pode se tornar uma verdadeira guerra de titãs.
A segunda: convencer meu filho. Já comecei a falar para o Bento que ele ia estudar na mesma escola que eu há pelo menos uns 2 anos (me julgem! Fiz o que achei melhor).
Só que, usando as palavras dos meus conterrâneos cariocas: eu arreguei (ou amarelei).
Quando chegou na hora de matar no peito e usar o viés da familiaridade e da inércia pra tomar uma decisão desse calibre eu voltei atrás e decidi "pesar os prós e contras" e "aumentar o meu leque de escolhas".
Meu lado cientista comportamental gritou: "você não vai tomar uma decisão baseada no seu sistema emocional, né minha filha?"
Porque era isso mesmo que eu tava fazendo. Eu tava bonitinha rezando na cartilha de titio Daniel Kahneman: substituindo uma pergunta difícil (qual a melhor escola pro Bento?) por outra mais fácil (eu gostei de onde eu estudei?).
Eu estava usando a minha feliz experiência da década de 90 e toda a minha projeção para tomar uma decisão importante e que teria efeitos no longo prazo pro meu filho (alguma semelhança com a decisão sobre aposentadoria, casamento, ter filhos e escolha profissional não é mera coincidência).
A ilusão da livre escolha 🧠
A primeira coisa que você precisa entender sobre escolher a escola de um filho é: você nunca estará decidindo livre de pressões sociais.
Existe uma expectativa social sobre essa escolha. No meu caso: a minha família espera que eu coloque meu filho nas top 5 melhores escolas do Rio de Janeiro.
Porque foi isso que meus pais - que ganhavam muito menos do que eu - fizeram.
Eles pagaram uma das melhores escolas do Rio, mesmo que isso tenha lhes custado à época: lazer, qualidade de vida, ambiente familiar menos tenso, mais dinheiro para trocar carro, pagar mais rápido o financiamento da casa etc etc.
Lá em casa a regra é clara: escola boa primeiro, o resto depois.
Se colocar em escola mais barata você é um egoísta, um mão de vaca e um sem noção.
Além disso, existe todo um status envolvido na escolha da escola. Ninguém vai admitir, mas tem.
Encher a boca pra dizer "meu filho estuda na escola XPTO" é sim para muitos pais uma questão importante (assim como para muitos é ter o carro X, morar no bairro Y, viajar para o lugar Z, ter casa própria e assim por diante).
Ou seja, mais uma vez a emoção dando as caras na hora de definir algo tão importante.
Poucos vão fundo em outras questões:
- consigo pagar essa escola e os reajustes futuros?
- se precisar colocar outro filho na mesma escola: consigo pagar as 2 ou mais mensalidades?
- o ambiente que meu filho vai estudar é próximo ou muito longe da realidade dele? Como isso pode impactá-lo? Como isso impacta o consumo da família? Será que vamos querer acompanhar o novo ritmo desse grupo social para não nos sentir excluídos? O quanto isso pode gerar de estresse financeiro?
- essa escola vai aumentar ou diminuir a qualidade de vida da família?
- todos da família estão dispostos a sacrificar outras prioridades em prol da escola por uns 14 anos?
- essa escola se alinha aos meus valores atuais?
- o perfil do meu filho se alinha à escola?
O medo do arrependimento 🧠
Quando eu achava que bastava vencer os meus vieses e heurísiticas, vem o medo do arrependimento. Isso é típico de situações que envolvem muitas opções e não é possível ter clareza sobre a superioridade de uma opção sobre as demais.
Quando eu abri o leque de opções de escola eu abri mais mil perguntas na minha cabeça, pois:
- uma escola é maior
- outra escola é bilíngue
- outra é mais perto de casa
- outra é menos bolha social
- uma tem foco na parte social
- outra tem foco na robótica e sustentabilidade
- uma tem um olhar mais individualizado
etc etc etc
Me senti escolhendo entre planos de celular de 3 operadores diferentes. É uma tarefa praticamente impossível saber o melhor custo benefício, porque as opções são muito diversas. O que compensa mais: ser bilíngue ou ter mais espaço? Não sabia responder.
O triunfo do Sistema 1 🧠
Eu bati perna, avaliei várias possibilidades de escolas, escutei algumas abordagens pedagógicas...mas o que foi determinante? A emoção.
Quando eu entrei na minha ex escola e avistei a minha sala de aula eu caí no choro.
Eu tentei usar o Sistema 2. Eu juro.
Mas como a gente aprende estudando ciências comportamentais: no final do dia ainda é o Sistema 1 (nosso sistema emocional de tomada de decisão) que dá a cartada final. Quem disse que ia ser fácil vencer a emoção?
Mas uma coisa é certa: se você me perguntar o motivo da escolha da escola o Sistema 2 (sistema racional de tomada de decisão) tem as justificativas racionais na ponta da língua!
Beijos e até a próxima neuro.letter 💌!
Carol