Estava indo ao dentista e peguei um taxi. Lá pelas tantas o taxista me disse num lamúrio: eu vejo essa gente bebendo uma cervejinha no bar, mas não posso.
Eu, que tava achando que ele tava julgado as pessoas que bebem chopp no bar às três da tarde, enquanto ele trabalhava, fiquei surpreendida quando ele disse: não que eu não queira beber uma cervejinha. Mas é que eu não posso. Não tá sobrando dinheiro.
E isso me deixou pensativa: caramba, não tá sobrando 40 pilas pra tomar um chopinho no bar. Uma pequena indulgência?! Pois é. Quando falta até para pequena indulgência pode ser o momento de refletir. E é aqui que entra o Labubu.
Eu poderia falar hoje sobre as estratégias de marketing e do uso dos princípios das ciências comportamentais que ajudaram na propagação da febre Labubu, como as famosas caixas surpresa, que oferecem seis designs possíveis — e a chance de uma variante "secreta". Note que a Pop Mart anuncia que os compradores têm uma chance em 72 de desembalar essas versões cobiçadas, ativando a dopamina igual a um jogo do tigrinho (já que ficamos mais motivados a comprar quando temos chances incertas de ganhar algo - socorro, alguém desliga o cérebro)!
Tem também as collabs, que fez com que o Labubu pegasse emprestado um pouco do prestígio e legitimação das grandes marcas pra si (efeito halo).
Mas vou colocar o bode na sala: Labubu pode se tornar um novo índice de recessão.
Tá tudo caro e as pessoas parecem estar ressabiadas (ou sem dinheiro mesmo) em comprar coisas caras ou apostar no futuro. O otimismo está em baixa.
E a cultura mostra sinais claros disso, com a popularidade da nostalgia (roupas e músicas dos anos 2000 bombando - o que me dá vontade de gritar: Minha gente, nem a gente que viveu os anos 2000 gostava dessas roupas, apenas PAREM) e o sucesso das pequenas indulgências e de símbolos de status mais acessíveis (dentre eles, o Labubu).

Mas como saber que estamos em vias de viver uma nova recessão?
Para bater o martelo sobre isso, os economistas precisam analisar dados mensuráveis — como PIB, taxa de (des)emprego, renda, produção industrial e vendas no varejo. Tecnicamente, recessão é definida como queda significativa na atividade econômica que dura por 2 ou mais trimestres consecutivos. Esse é o dado oficial que deveria balizar nossas decisões.
Mas recessão é mais que um dado econômico-financeiro. É também um sentimento que se transmuta em comportamento.
Existem estudos que analisam a recessão pelo ângulo comportamental e é isso que faz meu olho brilhar!
Enquanto a maioria fica debatendo se comprar Labubu e Bebê Reborn é coisa de adulto infantilizado ou demonstração de status, essas compras mostram algo muito mais profundo, que pode ser resumido pelo efeito batom.
Quando o cenário financeiro aperta — como apertou na pandemia, por exemplo — a resposta racional deveria ser economizar mais. Mas sabe o que acontece muitas vezes? As pessoas se permitem pequenos prazeres. Um batom, um café especial, uma vela perfumada ou um Labubu colecionável.
É uma forma de dizer: “mereço um carinho agora” ou “isso eu posso ter". E, para muitas pessoas, comprar por impulso vira não só uma válvula de escape, mas uma estratégia para lidar com a ansiedade financeira.
Se não dá pra comprar uma casa, um carro e uma viagem pra Paris: compro um batom da Rhode, um Labubu ou como um doce no café da Louis Vuitton.
Isso acontece com ainda mais força dentre os Gen-z, como um mecanismo de defesa contra o mundo policrise em que vivemos.
Lendo sobre o assunto, encontrei um artigo (não científico) que falava da existência de índices (inusitados) que demonstram sinais de recessão. A explicação deles é sustentada em argumentos de comportamento do consumidor, que fazem muito sentido, apesar de vários deles terem limitações e não serem considerados como índices oficiais.
Na dúvida, corte o snack. Estudos mostraram que na crise de 2008 o consumo de lanches — fast food, chips, docinhos — despencou. Não é só sobre calorias. É sobre confiança: se o consumidor para até de comprar o que traz prazer rápido, é porque tá bem inseguro.
2. Mini Garrafa de Álcool
Em tempos difíceis, o uísque full size dá lugar à versão mini. Empresas como a Brown-Forman (Jack Daniel's) notaram um aumento nas vendas de garrafinhas em recessões. É o luxo emocional em porção controlada. E também, claro, mais barato.
Clássico! Leonard Lauder (Estée Lauder) percebeu que, em 2001, as vendas de batons subiram durante a recessão. A lógica? Quando não dá pra gastar muito, a gente se mima com um “luxo acessível”. Mas... o índice anda perdendo força. A inflação alta de 2024-25 fez até o batom virar supérfluo pra muita gente. Leia mais aqui.
4. Índice da Cueca (Underwear Index)
Alan Greenspan, ex-Fed, notou: homens param de comprar cueca quando a grana aperta. Ninguém vê, ninguém liga — e a prioridade vira pagar boleto. A venda de cuecas caiu nas crises de 2008 e 2020, e subiu só quando a maré virou.
**Aqui faço um breve parêntesis pra dizer que teve um estudo que sugeriu que o efeito batom é impulsionado pelo desejo das mulheres de atrair parceiros com recursos. Enquanto isso homens estão usando cuecas velhas. Socorro!!
Saia longa demais? Cuidado. Desde os anos 1920, há quem diga que o comprimento das saias segue o humor econômico: em tempos de bonança, saias curtas. Em crise? Saias longas.
Resumindo: bainhas mais curtas em períodos de expansão, mais longas em períodos de recessão. A ideia central é que crises provocam ansiedade e medo, levando o sujeito a buscar segurança, estabilidade e controle — valores associados ao conservadorismo.
O índice de bainha pode até render boas histórias, mas será que funciona como um verdadeiro indicador econômico? Alguns estudos já exploraram a relação entre o comprimento das saias e o cenário financeiro, mas o que se observa é uma correlação cultural — não uma ferramenta confiável de previsão.
6. Caixa de Papelão
Nada mais pragmático. Se o número de remessas de papelão cai, é porque tem menos mercadoria circulando. Em 2022, as remessas nos EUA caíram 8,4% — a maior queda desde a crise de 2008. A caixa virou termômetro da desaceleração.
7. Índice da Assadura
Parece piada, mas é real: quando os pais racionam fraldas, aumentam os casos de assadura. E aí, disparam as vendas de pomadas. Aconteceu em 2011 e é um reflexo cruel de como o aperto bate até nas rotinas mais básicas de cuidado.
8. Índice do Champanhe
O oposto do batom. Quando o clima é bom, tem brinde e celebração. Em recessões, o champanhe sai da taça — e entra a cervejinha mesmo. Em 2009, a venda nos EUA caiu quase pela metade. E só se recuperou em 2021, com o boom pós-isolamento.
👠 Bônus: Índice das Strippers
Sim, você leu certo. Gorjetas em casas noturnas — ou em qualquer serviço baseado em gratificação (como garçons e motoristas) — caem quando a economia trava. Menos dinheiro no bolso = menos gorjeta na mão. E esse dado comportamental tem sido usado como radar informal por alguns economistas.
Eu amei um texto publicado no Linkedin sobre isso e da frase: a cultura virou alfabetização econômica.
Eu sei: é muita notícia negativa e parece que vivemos o fim dos tempos, como falei nessa news AQUI.
Mas queria lembrar que recessão não se faz só com dados, mas também com narrativa.
Esse descompasso entre dado oficial e experiência real do consumidor cria um terreno fértil para narrativas. E são essas narrativas que moldam o comportamento:
"Está tudo caro, mas é passageiro" → consumo adiado
"Nada vai melhorar" → retração total, pânico
"Vamos nos adaptar" → consumo seletivo, novos hábitos
Quem domina a narrativa, molda o comportamento
A mídia, os governos, os influenciadores e até os economistas disputam a narrativa econômica dominante. E isso tem efeitos concretos:
Se a narrativa dominante for de recessão, o medo se multiplica e isso impacta o consumo e decisões de compra.
Se for de resiliência e adaptação, o consumo se reorganiza — mas não paralisa.
O efeito batom, por exemplo, é uma resposta narrativa — "não posso viajar, mas posso comprar um mimo". O índice da cueca, das mini garrafas, das fraldas… todos são expressões micro de grandes histórias macro.
O quanto você tem sido impactado por narrativas? Você confirma a narrativa com dados oficiais? E seu cliente: você consegue entender como ele vem sendo impactado pelas emoções?
Sem entender como o cérebro funciona: viramos prisioneiros dos pensamentos.
Sem entender o cérebro do cliente: viramos mentores superficiais.
Aprofunde.
Beijos e até a próxima,
Carol
Hoje faz 1 ano que publiquei a primeira neuro.letter no substack!!
Esse é o espaço onde mais gosto de criar ;)
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